domingo, 10 de novembro de 2013

domingo, 10 de novembro de 2013


Nem tudo que reluz é ouro ou as cintilações ofuscadoras dos objetivos da Academia

Guilherme Gomes da Silveira d'Avila Lins *


Durante suas sete primeiras décadas a Academia Paraibana de Letras (APL) vinha caminhando principalmente ao longo de duas rotas muito representativas, ou seja, a própria riqueza intelectual e a modéstia de suas instalações físicas, decorrente da penúria financeira que lhe é peculiar. Embora algo incômoda, essa aparência exterior pouco suntuosa tem até reforçado sua tradicional austeridade. Acrescente-se ainda que, de um modo geral, a tônica das demais entidades congêneres não é muito diferente. Apesar disso, bem ou mal, todas elas vêm sobrevivendo com pouco trato cosmético e às custas de seus conteúdos intelectuais e culturais. Que não se entenda aqui que considero dispensável a beleza material mas esta andorinha por si só não faz verão num Academia de Letras.
Por certo a beleza material da APL será sempre bem-vinda até porque nosso tradicional emblema acadêmico (inspirado no da Academia Francesa [1635], no da Academia Nacional de Me)dicina [1829], no do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro [1838] e obviamente no da Academia Brasileira de Letras [1897]) contém justamente a expressão latina DECUS ET OPUS (ESTÉTICA E TRABALHO). Não nos esqueçamos, entretanto, que aí o DECUS diz respeito à beleza do conteúdo literário e cultural pois se trata de uma instituição voltada para estas áreas. Aliás, este DECUS até pode transbordar seu significado para a aparência externa embora, às vezes, isto possa ser enganoso pois, como já disse o inesquecível e inevitável Exupéry, "O essencial é invisível aos olhos". De qualquer forma, seja qual for o significado dessa palavra, é evidente que no nosso caso o DECUS não se sustenta sem o OPUS. Isto porque o OPUS naquele emblema acadêmico se reporta às obras (latu sensu) de natureza intelectual que constituem o sopro de vida da entidade. Não se deve confundir, porém, essas obras ou atividades de natureza intelectual com certos eventos regimentais do tipo homenagem póstuma ou posse acadêmica porque tais atividades, tão necessárias e louváveis, cumprem apenas específicas obrigações administrativas da instituição e até ultrapassam os muros da Academia mediante suas repercussões sociais. Independente disso, tais solenidades precisam respeitar a austeridade dos seus ritos tradicionais, tidos como praxes consuetudinárias, por isso mesmo imunes a inovações extra petita. Neste particular, infelizmente, muita coisa ali está "fora de lugar", como já disse Geraldo Vandré.
É que nos últimos tempos a APL vem esquecendo sua original vocação, preponderantemente intelectual e cultural, e está a adotar agora uma trilha cultivadora da aparência externa (de conteúdo distorcido) em que sobra o que reluz e cintila. "Coroando" essa nova senda, entre outras novidades e sem qualquer endosso legal, alterou-se seu tradicional rito de posse, transformando-o numa afetada encenação teatral quase patética, até então inédita na sua história e inexistente nas entidades congêneres, inclusive a Academia Brasileira de Letras, a qual, como fonte inspiradora é a mater familiae. Ademais esse "moderninho" e curioso rito de posse na APL inclui ainda uma particular e inusitada veste talar com direito até o capelo para, por assim dizer, "ungir" o novo empossando. A "pomposa" veste talar pretende simular a beca dos Deões das velhas universidades ao conferirem um verdadeiro grau acadêmico (universitário). Enfim, essa atual tendência apócrifa da moda acadêmica na APL delineia uma alienígena e tragicômica manifestação de poder fantasioso que Freud pode bem explicar (e eu me permito também interpretar aqui, já que fui psicanalisado por psicanalista didata em São Paulo). Entristece o fato de que tudo isso realça bastante o que mais está faltando atualmente na Academia.
A bem da verdade a APL não é, não precisa fingir que é nem jamais foi uma instituição de ensino superior que confere grau universitário, seja ele qual for. Além disso, não possui Reitor mas sim Presidente eleito democraticamente  e sem poderes absolutistas. Afinal de contas nenhum empossando fica lá mais valorizado do que já é ao "receber" um "grau acadêmico" que não existe, "conferido" por uma instituição sem autoridade para tanto Creio que este tipo de cena surreal está sendo até insuficiente porque, além de se dar lá a impressão pública de que se "concede" um "grau acadêmico" aos seus empossandos, a APL resolveu também, por exemplo, ao patrocinar uma justíssima solenidade comemorativa, tomar como parceira oficial uma "entidade cultural" que nunca existiu no plano real. Como se vê, estamos de fato vivendo tempos surreais.
É diante de tudo isso que, como Membro Efetivo da APL (até prova em contrário) tenho sentido nos últimos tempos muita fome de atividades literárias e culturais próprias, por ela promovidas, tais como palestras, conclaves, cursos e outros encontros (até os informais), como já sugeri anteriormente. Em tempo, não estou me reportando aqui àqueles bem-vindos e eventuais lançamentos de livros de autores não pertencentes ao seu quadro, os quais recorrem à Academia com tal intento. Este tipo de evento promocional, de natureza cultural, é bastante saudável porém não deve ser confundido com as já mencionadas atividade culturais próprias da Academia. Também tenho sentido muita sede de uma ordem administrativa mais eficiente e mais compartilhada com os demais Membros dessa Academia que são (no máximo) apenas quarenta, a fim de que ela não venha a se expor (na Internet por exemplo) como fonte de informações vexatórias e descabidas, de erros de várias naturezas, além de outros dados inaceitáveis. Até sua tradicional Revista está esquecida desde 2011. Trata-se portanto de uma situação muito constrangedora para quem gosta de letras e cultura.


* Professor Emérito da Universidade Federal da Paraíba (UFPB), Ex-Pesquisador de História do Núcleo de Documentação e Informação Histórica Regional da Universidade Federal da Paraíba (NDIHR/UFPB), Membro Efetivo do Instituto Paraibana de Genealogia e Heráldica (IPGH), Membro Efetivo do Instituto Histórico e Geográfico Paraibano (IHGP), Membro Honorário do Instituto Histórico e Geográfico do Cariri (IHGC), Membro Correspondente do (extinto) Instituto Histórico e Geográfico de Campina Grande (IHGCG), Membro Correspondente do Instituto Histórico de Campina Grande (IHCG), Membro Correspondente Brasileiro do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (IHGB), Membro Correspondente do Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Norte (IHGRN), Membro Correspondente do Instituto Arqueológico Histórico e Geográfico Pernambucano (IAHGP), Membro Correspondente do Instituto Histórico e Geográfico de Alagoas (IHGAL), Membro Correspondente do Instituto Geográfico e Histórico da Bahia (IGHBA), Membro Correspondente do Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo (IHGSP), Membro Correspondente do Instituto Histórico e Geográfico do Paraná (IHGPR), Membro Efetivo da Sociedade Paraibana de Arqueologia (SPA), Membro Efetivo da Academia Paraibana de Medicina (APMED), Membro Efetivo da Academia Paraibana de Filosofia (APF), Membro Efetivo da Academia Paraibana de Letras (APL) Membro Efetivo (Fundador) da Academia de Letras e Artes do Nordeste - Núcleo da Paraíba (ALANE - PB), Membro Efetivo da União Brasileira de Escritores - Núcleo da Paraíba (UBE - PB), Membro Efetivo da Sociedade Brasileira de Médicos Escritores - Regional da Paraíba (SOBRAMES - PB) e Membro Efetivo da Academia de Letras de Areia (ALA).